Em um mesmo conjunto , podemos ter definidas duas topologias e . Pode acontecer que , por exemplo. Neste caso, sempre que for contínua, teremos que também será contínua. Também podemos concluir que
Pode ser que não tenhamos nem , nem . Duas topologias nem sempre são comparáveis.
Se e são duas topologias em um mesmo conjunto e , então dizemos que é mais forte ou mais fina que . Também dizemos que é mais fraca que . Podemos também dizer que é menor que , ou que é maior que . Veja a Observação 5.3.
A topologia determina quais são as sequências que convergem e quais não convergem. Se imaginarmos a topologia como uma “peneira” que deixa passar apenas as sequências convergentes, quanto mais fina for a topologia, menos sequências passarão como convergentes. Veja a Figura 5.1.
Seja um conjunto qualquer, e uma família de topologias em . Então é uma topologia em .
Demonstração. Basta verificar que satisfaz os axiomas listados na Definição 4.1. Por exemplo,
□A relação “mais forte que” define uma ordem parcial na família
das topologias de um conjunto . Esta ordem é simplesmente a restrição da relação de inclusão definida em à família .
Existe um elemento máximo dentre todas as topologias de . É o conjunto das partes de , , que é a topologia mais forte que pode ser definida em . Por outro lado, é a topologia mais fraca em .
A Proposição 5.2 mostra que dada uma família de topolgias , existe a maior topologia que é menor que todas as . Essa topologia é o ínfimo das . Escrevemos
ou
Por outro lado, a união de topologias não é necessariamente uma topologia. No entanto, se considerarmos a família
de todas as topologias que são maiores que todas as , sabemos que a família não é vazia, pois . Seja então o ínfimo de :
A topologia é a menor topologia que é maior que todas as . Essa topologia é o supremo de , e é denotada por
Quando é um espaço topológico dotado de duas topologias e , o que podemos dizer da relação entre essas topologias se soubermos que a aplicação identidade
é contínua? A resposta é simples:
Vamos generalizar isso para uma aplicação qualquer
Seja um conjunto qualquer e um espaço topológico. Dada uma aplicação qualquer , define uma topologia em .
Demonstração. Basta notar que , se , então e com . Como é uma topologia, . Assim, . Podemos fazer analogamente para a união arbitrária de elementos de . Basta observar que comuta com as operações de união e interseção. □
Pela Proposição 5.4, dizer que é contínua é o mesmo que dizer que a topologia é mais fraca que . De fato, é fácil verificar que é a menor topologia que faz com que seja contínua.
A construção feita na Observação 5.3 é muito comum. É essa construção que em álgebra, por exemplo, nos permite definir para um espaço vetorial e um subconjunto qualquer , o menor subespaço de que contém . Este é o subespaço vetorial gerado por . Do mesmo modo, para um grupo e um subconjunto qualquer , pode-se definir o que seria o grupo gerado por . Esse seria o menor subgrupo de que contém . Existem exemplos também em teoria da medida. Assim, como na Proposição 5.2, a interseção de uma família de subgrupos é um subgrupo, a interseção de uma família de subespaços vetoriais é um subespaço vetorial.
Seja um conjunto, e uma família qualquer de subconjuntos de . Então a topologia
é a topologia gerada por . Essa é a menor topologia de que contém a família .
Seja um conjunto qualquer, e uma família qualquer de subconjuntos de . Mesmo sem definir o que venha a ser uma base para a topologia (Definição 5.13), vamos definir o conjunto
e chamá-lo de base induzida pela família . Aqui, usamos a convenção de que .
Observação 5.7. Na Definição 5.6, utilizamos a seguinte convenção:
Esta convenção se torna mais natural se, considerando a relação de ordem em , interpretarmos e como sendo operadores de supremo e ínfimo, assim como fizemos na Observação 5.3. Desta forma, dado ,
é o menor subconjunto de que é maior que todos os conjuntos em . Se é vazio, então o menor subconjunto seria justamente . Da mesma forma,
é o maior subconjunto de que é menor que todos os conjuntos em . Se , este conjunto é simplesmente o maior subconjunto de , que é o próprio .
Por um abuso de notação, quando , por vezes escrevemos no lugar de . E quando é uma coleção de famílias de subconjuntos de , escrevemos ao invés de . As seguintes propriedades da topologia gerada por uma família são consequência direta da definição. O leitor deve ficar atento para a diferença entre
e
Sejam e famílias de subconjuntos de , e uma topologia em . Então, valem as seguintes propriedades:
Demonstração. Vamos mostrar apenas o item (8), que é mais difícil. O restante fica como exercício. :-)
É evidente, pelo item (2), que
No entanto, novamente pelo item (2), sabemos que para todo ,
E portanto,
Agora, pelo item (5),
Qual é a forma de um aberto de quando expresso em termos de ? Obviamente que a topologia gerada por deve conter todas as interseções finitas e todas as uniões de elementos de . Mas isso nem sempre é suficiente. A Proposição 5.9 nos diz como podemos escrever os abertos da topologia gerada em termos de conjuntos da sub-base.
Seja uma sub-base para um espaço topológico . Ou seja, . Considere a base induzida das interseções finitas de conjuntos de . Então, todos os conjuntos da topologia são uniões de conjuntos de :
Demonstração. A topologia necessariamente contém . Assim,
Considere então, a família dada pelas uniões de elementos de :
Novamente,
Para concluir que , basta mostrar que é uma topologia. Assim, como é a menor que contém , poderemos concluir que . É imediato que
Também é evidente pela própria definição de , que é fechado por uniões arbitrárias. Basta então verificar que se , então . Onde, para adequados,
Mas, neste caso,
onde . Agora, basta notar que , pois é fechada por interseção finita. □
Se temos uma aplicação , e uma sub-base de , como podemos dizer, olhando para , se é ou não contínua. Um primeiro “chute” seria talvez dizer que basta que . Obviamente que esta é uma condição necessária. A proposição seguinte é o elo que falta para mostrar que a condição é equivalente à continuidade de .
Demonstração. Vamos utilizar a seguinte notação:
Por definição, é uma topologia. É fácil ver (Exemplo 4.5) que também é uma topologia. Como , segue que
pois é a menor topologia com tal propriedade. Resta então mostrar que dado , teremos .
Pela Proposição 5.9, dado , basta mostrar que pode ser escrito como uma união arbitrária de interseções finitas de elementos de . De fato, , onde é uma união arbitrária de interseções finitas de elementos de . Como comuta com as operações de união e interseção, temos a expressão desejada para , concluindo a demonstração. □
Conforme prometido, vamos utilizar a Proposição 5.10 para mostrar que para uma aplicação ser contínua, basta que .
Demonstração. É evidente que a condição é necessária. Vamos mostrar que é suficiente. Pela Proposição 5.10, temos que
Mas a hipótese implica que . Ou seja,
Observação 5.12. Frequentemente, demonstrações de que determinada função é contínua ficam excessivamente complicadas porque o autor da demonstração refez o argumento das Proposições 5.10 e 5.11. Veja, por exemplo, a demonstração da Proposição 7.14.
5.2.1. Considere em sua topologia usual, , a topologia da continuidade inferior, e a topologia da continuidade superior, . Mostre que , onde é um espaço topológico qualquer, é contínua na topologia se, e somente se, for contínua nas topologias e .
5.2.2. Seja uma família de subconjuntos de que não cobre . Ou seja, . Considere a topologia em gerada por , e mostre que existe tal que .
Dada uma família de subconjuntos de um conjunto , a base induzida tinha uma propriedade interessante:
Todo aberto de é uma união de elementos de .
Cada família com essa propriedade é uma de base da topologia. Quando construímos a topologia dos espaços métricos, as bolas formavam uma base para a topologia (Proposição 3.14).
Seja um espaço topológico. Uma família é uma base para a topologia quando todo conjunto puder ser escrito como uma união de elementos de . Aqui, seguimos a convenção de que ,
Como de costume, vamos ver outras maneiras de caracterizar o que vem a ser uma base para uma topologia . Note que uma das condições da Definição 5.13 é que .
Seja um espaço topológico e uma família de subconjuntos de . Então as seguintes afirmações são equivalentes:
é uma topologia de . E além disso, .
é uma base de vizinhanças de (veja a Definição 4.10).
Pela definição de base, é uma base para . Como
temos que .
Se é base para , então . Seja . Então, é aberto e . Como o conjunto é da forma
para alguma sub-família , basta escolher tal que , para que
Evidentemente que , já que a família é formada por conjuntos abertos que contém . Basta mostrar que para toda vizinhança de , existe tal que . Mas a existência de tal é justamente a hipótese do item (3).
Se e , então, por hipótese, e são vizinhanças de . Portanto, também é vizinhança de . Como é uma base de vizinhanças de , então existe tal que
Precisamos então verificar que gera . Primeiramente, note que todo conjunto é aberto, pois se , então . Ou seja, é vizinhança de todos os seus pontos. Assim,
Por outro lado, todo aberto de pode ser escrito como uma união de elementos de , pois dado , para cada existe tal que . Ou seja,
E portanto,
É evidente que , pois nenhum dos é vazio. (Note que acabamos provando que (4) (2).)
Já sabemos que . Pela hipótese de ser a união de todos os conjuntos em , . Por definição, é evidentemente fechada por união arbitrária. Resta mostrar que é também fechada por interseção finita. Para isso, basta notar que e são da forma
para adequados. Assim,
sendo que, é fácil verificar que as hipóteses do item (5) implicam que cada é uma união de conjuntos em . Portanto, . □
Dada uma família qualquer , a Proposição 5.9 mostra que é uma base para . Em particular, toda família fechada por interseção finita é uma base para . Esse fato pode ser verificado também pelo item (5) da Proposição 5.14. Esta condição não é, no entanto, necessária para que seja uma base para . As bolas, por exemplo, formam uma base para a topologia de um espaço métrico, mas não é necessariamente verdade que a interseção de duas bolas será uma bola.
Corolário 5.16. Seja uma família de subconjuntos de , com . Para que seja uma base de é necessário e suficiente que para todo , possa ser escrito como união de elementos de .
Demonstração. A condição é evidentemente necessária. Para ver que é suficiente, basta verificar as condições do item (5) da Proposição 5.14. Evidentemente que gera . O restante da demonstração fica como exercício. □
A convergência de uma sequência pode ser entendida como:
Para toda vizinhança de , por menor que seja, existe tal que
A expressão “por menor que seja” é um aposto, e é supérflua, mas traduz bem o fato de a convergência poder ser descrita em termos de bases, ou bases de vizinhanças (veja a Observação 4.13 e a Proposição 5.14). O fenômeno da convergência pode ser ainda mais fácil de ser verificado se utilizarmos uma sub-base ao invés de uma base.
Proposição 5.17. Seja uma sub-base de um espaço topológico. Então, uma sequência converge para se, e somente se, para todo , com , existir tal que
Demonstração. Seja a base gerada por . Basta mostrarmos que a condição garante que para todo , com , existir tal que
Note que ou (neste caso, basta tomar ), ou , com . Neste último caso,
satisfaz a condição desejada. □
5.3.2. Toda base é fechada por interseção finita não vazia? Demonstre que sim, ou dê um contra exemplo.
5.3.3. Complete a demonstração do Corolário 5.16.
Principalmente quando trabalhamos com sequências de elementos, ou mesmo sequências de conjuntos, a existência ou não de bases ou bases de vizinhanças que sejam enumeráveis torna-se uma questão importante.
Definição 5.18. Dizemos que um espaço topológico é segundo-enumerável quando possuir uma base enumerável. Se todo possui uma base enumerável de vizinhanças, dizemos que é primeiro-enumerável.
Observação 5.19. A nomenclatura da Definição 5.18 é uma tradução direta da língua inglesa — first countable e second countable —, e é muito ruim. Se um espaço topológico possui uma base enumerável, não seria melhor dizer que possui base enumerável? Da mesma forma, neste livro, vamos dizer que possui base enumerável de vizinhanças. Ao invés de dizer primeiro-enumerável, vamos simplesmente dizer que todo ponto de possui base enumerável de vizinhanças.
Exemplo 5.20 (Espaço Métrico). Em um espaço métrico , um ponto qualquer possui uma base enumerável de vizinhanças. De fato, dado , as bolas de raio centradas em formam uma base de vizinhanças. Essa base de vizinhanças tem a propriedade de poder ser ordenada de forma decrescente. Ou seja,
Esta é a propriedade que nos permitiu estabelecer a equivalência entre continuidade com bolas e continuidade com sequências para aplicações entre espaços métricos. Veja a Proposição 2.10.
Na Definição 5.18, não mencionamos nada sobre a cardinalidade das sub-bases. A seguinte proposição explica porque.
Proposição 5.21. Em um espaço topológico com infinitos abertos, existe uma base com cardinalidade se, e somente se, existe uma sub-base com a mesma cardinalidade. Em particular, o espaço possui base enumerável se, e somente se possuir uma sub-base enumerável.
Demonstração. Como toda base é uma sub-base, basta mostrar que dada uma sub-base , existe uma base com a mesma cardinalidade que . Primeiramente, é preciso notar que a cardinalidade de não pode ser finita. Caso contrário, não existiriam infinitos abertos na topologia.
Note que a família
tem a mesma cardinalidade que (por quê?). Note também, que
e portanto, também tem a mesma cardinalidade que (por quê?). □
Os espaços tais que todo ponto possui uma base enumerável de vizinhanças são semelhantes aos espaços métricos. Onde usaríamos sequências de bolas de raio , usamos a proposição abaixo. Um exemplo é a Proposição 5.23.
Proposição 5.22. Seja um espaço topológico e um elemento qualquer. Se possui uma base enumerável infinita de vizinhanças, , então possui uma base de vizinhanças formada por conjuntos satisfazendo
Dizemos que é uma base de vizinhanças encaixantes.
Demonstração. Seja uma enumeração dos elementos de . Faça
Por ser interseção finita de vizinhanças de , cada é uma vizinhança de . E dada uma vizinhança qualquer de , , existe tal que . Ou seja,
E portanto, os conjuntos formam uma base de vizinhanças de . □
É claro que se possuir uma base finita de vizinhanças, então possui uma base formada por apenas um elemento: a interseção de todos os elementos da base finita.
Em um espaço onde todo ponto possui base enumerável de vizinhanças, a topologia pode ser inteiramente descrita através de sequências e seus limites.
Proposição 5.23. Seja um espaço topológico, , e uma base enumerável de vizinhanças de . Então, a família pode ser inteiramente determinada se soubermos quais são as sequências que convergem para .
Demonstração. Pela Proposição 5.22, podemos assumir que , com .
Vamos mostrar que é vizinhança de se, e somente se, para toda sequência convergente , tivermos um tal que . Se é vizinhança de , então, é evidente que para toda sequência existe um tal . Por outro lado, se não é uma vizinhança de , então, para cada , existe tal que . Tome . A sequência converge para (por quê?). No entanto, para a sequência , não existe o referido . □
Um exemplo de aplicação da enumerabilidade de uma base da topologia, é a demonstração da Proposição 9.28. Uma propriedade que está bastante relacionada é a separabilidade do espaço topológico.
Definição 5.24 (Espaço Separável). Um espaço topológico é separável quando houver um subconjunto enumerável denso. Ou seja, quando existir enumerável tal que .
Uma das utilidades de se demonstrar que um espaço possui base enumerável, é poder concluir que este espaço é separável.
Demonstração. Seja uma base enumerável. Agora, para cada , escolha . Então, o conjunto é denso. □
Por outro lado, uma das utilidades de se demonstrar que um espaço é separável, é, em alguns casos, poder concluir que este espaço possui base enumerável. É o que faremos na demonstração da Proposição 9.28.
Demonstração. Pela Proposição 5.25, basta mostrar que se for separável, então tem base enumerável. Seja um subconjunto enumerável denso. Basta, então, mostrar que
é uma base para a topologia de .
Como é uma família de abertos, basta mostrar que para todo , dado , existem e tais que
Pela densidade de , podemos escolher tal que . Assim, basta tomar , pois além de termos , também temos que para todo ,
Ou seja, . □
5.4.1. Seja uma família de subconjuntos de . Mostre que se é uma família finita, então a topologia gerada por também é finita.
5.4.2. Onde foi usado que na Proposição 5.21?
5.4.3. Dê um exemplo de um espaço topológico onde existe uma base finita de vizinhanças de um certo elemento , mas não existe uma base de vizinhanças composta por apenas um elemento.
5.4.4. Mostre que a sequência construida na demonstração da Proposição 5.23 de fato converge para .