Capítulo 7
Topologias Derivadas de Outras Topologias

7.1 Topologia de um Sub-Espaço

Se temos um espaço topológico X,τX e um subconjunto Z X, então parece natural pensarmos na restrição da topologia τX ao subconjunto Z. Mas isso é realmente natural? Vamos fazer algumas considerações.

Imagine que xn Z é uma sequência (o ideal seria falar de “redes” — veja o Capítulo ??) que na topologia τX converge para x Z. Neste caso, se fôssemos “induzir” em Z uma topologia τZ a partir de τX, sua topologia deveria ser tal que para xn,x Z,

xn τXx xn τZx.

Pensando em termos da operação de fecho, para um conjunto B Z, o conjunto dos pontos de Z que estão “próximos” — ou seja, no fecho — de B são, intuitivamente, os pontos de Z que estão em clτX B. Ou seja, deveríamos ter que

clτZ B = Z clτX B.

Vendo do ponto de vista da continuidade, se f : X,τX Y,τY é uma aplicação qualquer, e W Y é tal que f(X) W, então podemos pensar na aplicação

f̄ :X W x f(x) ,

e esperar que possamos induzir em W uma topologia tal que f é contínua se, e somente se, f̄ o for. Poderíamos também, dado Z X, pensar na continuidade de f|Z. Claro que esperaríamos que se f é contínua em z Z, então, na topologia induzida, f|Z deve ser contínua em z. Ou seja, se V é vizinhança de z em τX, Z V deve ser vizinhança de z em τZ. Dentre essas considerações, o menos natural é pensar em termos de abertos. E é por isso que este livro é “de vários ângulos”. :-)

Entretanto, como nossa definição de espaço topológico é em termos de abertos, com as ferramentas que temos até o momento, será mais fácil definir a topologia de um subconjunto em termos de abertos. Felizmente, a definição com abertos é extremamente simples.

Definição 7.1 (Topologia Induzida em um Subconjunto).

Seja X,τX um espaço topológico e Z X um subconjunto de X qualquer. Então, o conjunto

Z τX = Z A A τX

é a topologia induzida por τX em Z.

Notação. Na Definição 7.1, a notação Z τX não é a interseção de τX e Z, mas a família formada pela interseção dos elementos de τX com o conjunto Z. Este abuso de notação, em geral, não deve causar problemas de entendimento e será usado sem ressalvas.

Vamos então verificar que a definição de topologia induzida em um subconjunto satisfaz as propriedades discutidas no início do capítulo.

Proposição 7.2.

Seja X,τX um espaço topológico e Z X um subconjunto qualquer de X. Então a topologia induzida em Z, τZ = Z τX, satisfaz:

  1. Todo aberto A τZ da topologia induzida é da forma A = Z A para algum aberto A τX da topologia de X.
  2. Todo fechado F τZ da topologia induzida é da forma F = Z F para algum fechado F τX da topologia de X.
  3. Se x Z, então
    𝒱τZ x = Z 𝒱τX x.
  4. Se B Z, então
    clτZ B = Z clτX B.
  5. Para xn,x Z, então
    xn τXx xn τZx.
  6. Se Y,τY é um espaço topológico qualquer e f : Y,τY X,τX é uma aplicação tal que f(Y ) Z, então
    f̄ :Y,τY Z,τZ y f(y)

    é contínua se, e somente se, f é contínua. (Note que a diferença entre as aplicações f e f̄ é apenas o contra-domínio das aplicações)

  7. Se Y,τY é um espaço topológico qualquer e g : X,τX Y,τY é uma aplicação contínua, então
    g|Z :Z,τZ Y,τY z g(z)

    é contínua.

Demonstração. _ Itens (1) e (2).

Imediato da definição de τZ.

_ Item (3).

Imediato do item (1).

_ Item (4).

Este fato pode ser demonstrado de várias formas — de vários ângulos ;-). Vamos utilizar a Proposição 6.10, mas o leitor é motivado a demonstrar diretamente da definição de fecho (Definição 6.1).

Pela Proposição 6.10 e pelo item (2),

clτZ B = F: fechado de τZ BF F = F: fechado de τX BZF (Z F) = Z F: fechado de XBF F = Z clτX B.

(em que lugar da equação foi utilizado que B Z?)

_ Item (5).

Exercício.

_ Item (6)

Basta notar que f1(Z A) = f1(A).

_ Item (7)

Exercício. □

Observação 7.3. Para uma aplicação f : X,τX Y,τY e um subconjunto Z X, sempre que falarmos de propriedades topológicas de f|Z estaremos nos referindo à topologia Z τX. De modo mais geral, a menos que se diga o contrário, consideraremos Z X dotado da topologia Z τX.

Observação 7.4. Note que se Z é um aberto, então

Z τX = A τX A Z.

Em particular, os abertos da topologia induzida são também abertos na topologia original. Isso não vale em geral.

Da mesma forma, se Z for fechado, os fechados da topologia induzida serão exatamente os fechados da topologia original que estejam contidos em Z. (demonstre!)

Exemplo 7.5 (Topologia Induzida: [0,1) ). Considere a topologia no intervalo [0,1) induzida pela topologia usual dos números reais. Então, por exemplo, a família

0 = [0, 1 n) n

é uma base de vizinhanças abertas para o ponto 0.

Exemplo 7.6 (Espaço Métrico). Em um espaço métrico (X,d), temos a topologia τd, em X, induzida pela métrica d. Se Z X é um subconjunto qualquer de X, então, a princípio, temos duas maneiras canônicas de induzir uma topologia em Z. Temos Z τd, e temos também a topologia τdZ induzida pela restrição da métrica d ao conjunto Z:

dZ : Z × Z + (z1,z2) d(z1,z2) .

Essas duas topologias coincidem. (por quê? dica: o que são as bolas na métrica induzida?)

7.1.1 União Disjunta

Sejam X,τX e Y,τY espaços topológicos disjuntos. O leitor não deverá ter problemas para se convencer que é natural definir a topologia

τXY = U V U τX,V τY

em X Y . Note que τXY = τ τX τY . Essa topologia é caracterizada pela propriedade

τX = X τXY  e τY = Y τXY .

No Capítulo 8, estudaremos a existência de conjuntos que são fechados e abertos ao mesmo tempo. Se em um espaço topológico W,τW existe um subconjunto próprio não vazio, X W, que é aberto e fechado ao mesmo tempo, então seu complemento, Y = Xc também é aberto e fechado. Neste caso, os abertos de W são da forma U V , onde U τX e V τY . Dizemos que W,τW é desconexo (Definição 8.1).

7.1.2 Exercícios

7.1.1. Mostre que a família

τZ = Z τX

da Definição 7.1 é de fato uma topologia.

7.1.2. Dê um exemplo de um espaço topológico X,τX, um subconjunto Z X e uma função g : X,τX Y,τY tais que g não é contínua, mas g|Z é.

7.2 Topologias Inicial e Final

A topologia inicial é um dos conceitos mais importantes em topologia geral. Esta seção deve ser estudada com muita atenção.

Se temos uma aplicação f : X Y,τY de um conjunto X qualquer em um espaço topológico, a Proposição 5.10 mostra que f1(τY ) é uma topologia em X. Não apenas isso, mas é também a menor topologia que torna f contínua. De fato, f : X,τX Y,τY é contínua quando f1(τY ) τX. Mesmo quando estivermos tratando de uma família de aplicações

fλ : X Y λ,τλ,

podemos falar da topologia mais fraca em X que torna todas as fλ contínuas.

Definição 7.7.

Dada uma família de aplicações

fλ : X Y λ,τλ,(λ Λ),

a topologia τ f1 τλ ,λ Λ — a menor topologia tal que todas as aplicações fλ são contínuas — é chamada de topologia (inicial) induzida pela família fλ. Quando a família é composta por apenas uma aplicação f, a topologia inicial é denotada por τf.

Da mesma forma, dada uma aplicação f : X,τX Y de um espaço topológico em um conjunto Y qualquer, podemos nos perguntar qual seria a maior topologia que pode ser colocada em Y de modo que f seja contínua. O leitor deve se convencer de que a exigência “maior topologia tal que f seja contínua” faz sentido. Afinal, se f : X,τX Y,τY é contínua, então f será contínua se a topologia de τY for substituída por uma topologia mais fraca qualquer.

Definição 7.8.

Dada uma família de aplicações

fλ : Xλ,τλ Y (λ Λ),

a maior topologia em Y tal que todas as aplicações fλ são contínuas é chamada de topologia final induzida pela família fλ. Quando a família é composta por uma única aplicação f, denotamos a topologia final por τf.

Daqui por diante, vamos omitir o conjunto de índices Λ quando conveniente, para simplificar a notação.

Observação 7.9. O caso em que o uso da topologia final é mais útil, é quando se tem apenas uma função f. Para uma família fλ, se denotarmos por τfλ a topologia final induzida pela aplicação fλ, então a topologia final induzida pela família toda será

λΛτfλ .

Isso porque a inteseção de topologias é uma topologia.

Proposição 7.10.

Dada a aplicação f : X,τX Y , a topologia final induzida por f é a família

A Y f1(A) τ X.

Demonstração. Denote por a família A Y f1(A) τX. Evidentemente que τf , pois é a maior família tal que f1() τX. Basta então mostrar que é de fato uma topologia… deixemos isso como exercício ao leitor. :-) □

Exemplo 7.11 (f : 𝕊1). A aplicação

f : 𝕊1 x exp(2πxi)

é contínua quando consideramos as topologias usuais, τ de e τ𝕊1 de 𝕊1. A topologia inicial em quando consideramos a topologia usual em 𝕊1 é dada por

τf = A τ A = A + .

Ou, o que dá na mesma,

τf = A + A .

E qual é a topologia final de f : ,τ 𝕊1?

7.2.1 Diagramas Comutativos

Quando temos uma família de aplicações cada uma com seu domínio e seu contra-domínio, podemos representá-las em um diagrama. Por exemplo,

X  -f--// Y--h-// Z
 |       OO   ??
π|     g | ˜
   ˜ ----// ˜  h
X   f˜  Y.

Dizemos que o diagrama comuta quando “diferentes caminhos” correspondem à mesma aplicação. Se, por exemplo, o diagrama anterior comuta, então sabemos que g f̃ π = f; ou então, h̃ f̃ π = h f.

Vamos caracterizar as topologias inicial e final utilizando diagramas comutativos.

Proposição 7.12.

Dada a aplicação f : X Y,τY , a topologia inicial τf é a única topologia τX que torna f contínua e é tal que para todo diagrama comutativo

(Z,τZ)--g--//(X, τX)
     JJJJ      |
        ˜gJJJJJ  f
            %%
            (Y,τY ),

a continuidade de g é equivalente à continuidade de g̃.

Demonstração. Primeiro vamos mostrar que para τX = τf, a continuidade de g é equivalente à de g̃. Primeiramente, por definição, τf torna f contínua. Se g for contínua, então g̃ é contínua por ser a composição de duas aplicações contínuas. Por outro lado, supondo que g̃ é contínua, dado A τf, A é da forma f1(U), com U τY . Assim,

g1(A) = g1 f1(U) = g̃1(U).

Pela continuidade de g̃, este conjunto é aberto de Z. Ou seja, a imagem inversa de um aberto de X é aberto de Z. Portanto, g é contínua.

Falta mostrar que só existe uma topologia que satisfaz a condição da proposição. Suponha que τX e τX ambas satisfaçam a condição do enunciado. Considere a seguinte o seguinte diagrama comutativo.

     ′ --id--//
(X, τX )KKK    (X,τX )
        KKKKK   |f
        f  KK%%   |
             (Y,τY).

Neste caso, como τX satisfaz as condições do enunciado e f é contínua na topologia τX, temos que id : X,τX X,τX é contínua. Mas a continuidade da identidade é equivalente a

τX τX.

Invertendo os papeis de τX e τX, obtemos a unicidade:

τX = τ X.

Observação 7.13. Muitos autores começariam a demonstração anterior pela unicidade. Na demonstração da unicidade, não foi preciso utilizar a existência! Não foi preciso saber como é a “cara” da topologia τf. Optamos por considerar duas topologias quaisquer que satisfazem as condições impostas e demonstrar que são necessariamente iguais. Concluindo que se existe uma, então é única. Daqui por diante, quando possível, começaremos esse tipo de demonstração pela unicidade.

A Proposição 7.12 admite a seguinte generalização.

Proposição 7.14.

Considere a família de aplicações fλ : X Y λ,τY λ. A topologia inicial em X dada pela família fλ é a única topologia τX onde todas as fλ são contínuas, e para toda aplicação

g : Z,τZ X,τX

vale que

g é contínua λ Λ,fλ g é contínua.

Demonstração. _ Unicidade.

Seja τX uma topologia que satisfaz as condições do enunciado, e τX uma topologia onde as fλ são contínuas. Considere a seguinte família de diagramas comutativos indexada por λ Λ.

(X,τX ′)id -----//(X,τX )fλ
       fλMMMM       |
           MMMMM   |
               M&&   |
               (Y,τY).

Como τX satisfaz as condições da proposição e fλ é contínua na topologia τX, então id : X,τX X,τX é contínua. Ou seja,

τX τX.

Portanto, para uma topologia τX que também satisfaz as condições da proposição, se invertermos os papeis de τX e τX, chegaremos à igualdade.

_ A topologia inicial possui as propriedades enunciadas.

Suponha que τX seja a topologia inicial. Ou seja, a topologia gerada pela família

= fλ1(U) λ Λ,U τ Y λ.

Pela Proposição 5.11,

g é contínua g1 τ Z λ Λ,g1 f λ1(τ Y λ) τZ λ Λ,fλ g é contínua.

A topologia final tem forma semelhante à inicial quando utilizamos diagramas comutativos.

Proposição 7.15.

Dada a aplicação f : X,τX Y , a topologia final τf é a única topologia, τY que torna f contínua e é tal que para todo diagrama comutativo

(X,τX )JJ
  f|   JJ˜gJJJ
           g JJ%%
(Y,τY) ----// (Z,τZ),

a continuidade de g é equivalente à continuidade de g̃.

Demonstração. Para mostrar a unicidade, considere as topologias τY e τY , e suponha que ambas possuem as propriedades do enunciado. Então, o diagrama

(X, τX)JJJ
 f |   JJfJJ
          id JJ%%
(Y,τY )-----//(Z,τZ)

comuta, e o fato de f ser contínua em ambas as topologias implica que id é um homeomorfismo. Ou seja,

τY = τY .

Vamos então mostrar que τY = τf satisfaz as condições da proposição. A parte não trivial é mostrar que a continuidade de g̃ implica na continuidade de g. Seja A τZ, então

g̃1(A) = (g f)1(A) = f1 g1(A)

é aberto de X. Pela definição de topologia final, temos que g1(A) é aberto de τf. Ou seja, g é contínua. □

7.2.2 Exemplos

Exemplo 7.16. Seja (V, ) um espaço normado. Faça

f :V xx .

Vamos denotar por τ a topologia da norma e por τf a topologia inicial induzida em V por f.

A aplicação f é contínua em τ. Portanto,

τf τ.

No entanto, se U τf e x U, então y U para todo y V tal que y = x. Portanto,

τf τ.

Por outro lado, as vizinhanças de 0 são as mesmas em ambas as topologias.

Fica demonstrado que denotar a topologia da norma por τ foi uma escolha ruim, pois a topologia da norma NÃO é a topologia inicial induzida pela norma. :-p

Exemplo 7.17. Seja (X,d) um espaço métrico. Considere a família de funções

fx :X y d(x,y) ,

indexada por x X. Neste caso, a topologia da métrica d é exatamente a topologia inicial induzida pela família fx.

Exemplo 7.18. Seja Cb() o conjunto das funções limitadas de em . Para cada x , temos

Fx :Cb() f f(x) .

A topologia inicial definida em Cb() pela família Fx (x ) é a topologia da convergência ponto a ponto, onde

fn f x ,fn(x) f(x).

Veja a Seção 7.3.

Ainda podemos, para cada sequência xn com xn (ou ), definir

F(xn) :Cb() f limsup f(xn) ,

etc. Podemos sempre obter topologias mais e mais fortes. No entanto, todas elas são mais fracas que a topologia da norma do supremo, pois todas essas funções são contínuas quando Cb() é munido da norma

f = sup f().

Se também considerarmos as sequências xn , temos uma topologia mais forte ainda. Podemos ainda fazer o mesmo para o liminf e obtermos topologias cada vez mais fortes. No entanto, todas essas topologias continuam sendo mais fracas que a topologia da norma do supremo, pois todas essas funções são contínuas quando consideramos a norma do supremo em Cb().

7.2.3 Exercícios

7.2.1. Por que a topologia inicial é definida como a mais fraca tal que a família de funções fλ é contínua, e não como a mais forte?

7.2.2. Por que a topologia final é definida como a mais forte tal que a família de funções fλ é contínua, e não como a mais fraca?

7.2.3. Seja fλ : X Y λ,τλ uma família de aplicações. Mostre que

τ = τ τfλ,λ Λ

é, de fato, a menor topologia tal que todas as fλ são contínuas.

7.2.4. Seja fλ : Xλ,τλ Y uma família de aplicações. Mostre que

τ = τfλ

é a topologia mais forte tal que todas as fλ são contínuas.

7.2.5. Complete a demonstração da Proposição 7.10.

7.2.6. Dê um exemplo de duas funções f1 : X Y 1,τ1 e f2 : X Y 2,τ2 tais que

= τf1 τf2

não é uma topologia.

7.2.7. Seja f : 𝕊1,τ𝕊1 a aplicação do Exemplo 7.11. Mostre que

1 n τf7.

7.2.8. Seja f : 𝕊1,τ𝕊1 a aplicação do Exemplo 7.11. Mostre que

n + 1 n 23 τf11.

7.2.9. Seja f : ,τ 𝕊1 a aplicação do Exemplo 7.11. Fixado x , para cada 𝜀 > 0, seja I𝜀 = (x 𝜀,x + 𝜀). Mostre que

x = f(I𝜀) 𝜀 > 0

é uma base de vizinhanças de f(x) na topologia final.

7.3 Topologia Produto

Quando temos dois espaços métricos, (A,dA) e (B,dB), de que forma podemos gerar uma métrica em A × B? Se A e B forem o conjunto dos números reais com a métrica usual (euclidiana), o que poderia ser a métrica em 2? Poderia ser a métrica euclidiana (Exemplo 1.10), ou a métrica do máximo (Exemplo 1.11), ou então a métrica da soma. Pelo exercício ??, todas essas métricas são topologicamente equivalentes e possuem a seguinte propriedade

Para uma sequência (an,bn) A × B e (a,b) A × B, temos que

(an,bn) (a,b) an a e bn b.

Esta propriedade é facilmente verificada para a métrica do máximo e, pela equivalência topológica, vale para todas as três. A topologia produto que queremos definir — lembre-se que não temos uma métrica — será exatamente a topologia da “convergência/continuidade coordenada a coordenada”.

7.3.1 Entre dois Espaços

Inspirados pelo fato de que na métrica do máximo (Exemplo 1.11) as bolas são na verdade quadrados, vamos definir o produto de dois espaços topológicos como sendo o espaço onde a base da topologia serão os “retângulos”.

Definição 7.19 (Topologia do Produto de dois Espaços).

Sejam X,τX e Y,τY dois espaços topológicos. Definimos o espaço produto como sendo o espaço topológico X × Y ,τX×Y , onde τX×Y é gerada pelos conjuntos da forma U × V , onde U τX e V τY .

A topologia τX×Y é chamada de topologia produto. Por um abuso de notação, escrevemos τX × τY para designar a topologia produto. Quando queremos ser menos ambíguos, escrevemos X,τX ×Y,τY .

As projeções canônicas em X e Y

πX :X × Y X (x,y) x

e

πY :X × Y Y (x,y) y

exercem papel fundamental no estudo das topologias produto.

Observação 7.20.

Na Definição 7.19, poderíamos ter dito que a topologia produto é gerada pelos conjuntos da forma U × Y e X × V , onde U τX e V τY . No entanto, os conjuntos da forma U × V , além de geradores são também uma base da topologia. Isso está de acordo com a analogia com a métrica do máximo, onde as bolas — que são uma base para a topologia — são os “quadrados.” No caso da topologia produto, não temos “quadrados,” temos “retângulos.”

Proposição 7.21.

Sejam X,τX e Y,τY dois espaços topológicos e τX×Y uma topologia qualquer no conjunto X × Y . As seguintes afirmações são equivalentes.

  1. A topologia τX×Y é a topologia produto. Ou seja,
    τX×Y = τX × τY .
  2. Os conjuntos da forma A × B, onde A τX e B τY formam uma base de τX×Y .
  3. Os conjuntos da forma A × Y e X × B, onde A τX e B τY formam uma sub-base de τX×Y .
  4. A topologia τX×Y é a menor topologia em X × Y tal que as projeções canônicas são contínuas. Ou seja, é a topologia inicial induzida pelas projeções.
  5. Toda aplicação f : Z,τZ X × Y ,τX×Y com domínio em um espaço topológico Z qualquer é contínua se, e somente se, πX f e πY f forem contínuas.

Demonstração. _ (1) (2) (3)

Imediato da definição de topologia produto e da Observação 5.15. Basta notar que X × W V × Y = V × W.

_ (3) (4)

As projeções são contínuas se, e somente se, para todo U τX e V τY , U × Y = πX1(U) τX×Y e X × V = πX1(V ) τX×Y . Assim, a menor topologia em X × Y que torna as projeções contínuas é a topologia gerada pelos conjuntos da forma U × Y e X × V , para U τX e V τY .

_ (4) (5)

É um caso particular da Proposição 7.14. □

Observação 7.22. Se para f : Z X × Y escrevermos

f(z) = (fx(z),fy(z)),

então fx = πX f e fy = πY f. O item (5) da proposição diz que na topologia produto, f é contínua se, e somente se, fx e fy são contínuas.

Observação 7.23. Seja f : X × Y Z. O item (5) da Proposição 7.21 pode sugerir que a continuidade de f no ponto (a,b) X × Y seja equivalente à continuidade de f(a,) e f(,b). No entanto, a continuidade dessas duas seções de f é uma condição mais fraca que a continuidade de f.

Se f(a,) é contínua em b, isso significa que se “nos aproximarmos” de (a,b) na “vertical”, o valor de f se aproxima de f(a,b). A continuidade de f(,b) em a corresponde à continuidade de f na “horizontal”. No entanto, isso não garante nada sobre o comportamento de f quando “nos aproximamos” de (a,b) pela “diagonal”, ou mesmo por um caminho em “espiral”. Um exemplo concreto é a aplicação f : 2 , dada por

f(x,y) = 0 ,(x,y) = (0,0) xy x2+y2 ,(x,y)(0,0) .

Neste caso, f(0,y) = f(x,0) = 0. No entanto, f 1 n, 1 n = 1 2.

Observação 7.24. Para a topologia produto, também vale que

(xn,yn) (x,y) xn x,yn y. (7.1)

No entanto, como as sequências convergentes não determinam a topologia, não se pode afirmar que a condição acima determina a topologia produto.

Se ao invés de sequências, utilizássemos o conceito de redes — desenvolvido no Capítulo ?? —, a relação da equação 7.1 caracterizaria totalmente a topologia. Com redes no lugar de sequências, f será contínua se, e somente se, para toda rede zλ z, tivermos

fx(zλ) fx(z) e fy(zλ) fy(z).

7.3.2 Produto Finito

As considerações que foram feitas para o produto de dois espaços topológicos podem ser facilmente estendidas para definir e caracterizar o produto de uma quantidade finita de espaços topológicos.

Definição 7.25.

Dada uma família de espaços topológicos X1,τX1 ,, Xn,τXn, a topologia produto é a menor topologia de X1 × × Xn onde as projeções em cada coordenada,

πj :X1 × × Xn Xj (x1,,xn) xj ,

são contínuas. O espaço (topológico) produto X1,τX1 × ×X1,τX1 , é o conjunto X1 × × Xn, dotado da topologia produto.

O leitor fica encarregado de enunciar e demonstrar uma proposição análoga a 7.21.

7.3.3 Produto Infinito

Se temos um espaço topológico Xλ,τλ para cada λ Λ, pela experiência com o produto de uma família finita de espaços topológicos podemos logo imaginar duas topologias que poderíamos chamar de topologia produto. Uma delas, seria a topologia em λΛXλ gerada pela família dos conjuntos da forma λΛAλ, onde Aλ τλ. Se estivéssemos falando de espaços métricos, seria como definir a métrica do supremo (veja o Exemplo ??). Esta topologia é bastante geométrica e intuitiva. No entanto, não é esta a topologia que chamamos de topologia produto da família τλ (λ Λ). A topologia produto é um pouco mais fraca, possui propriedades importantes (por exemplo, o Teorema 9.41) e é, em geral, mais fácil de se trabalhar.

Definição 7.26. Dada uma coleção qualquer de espaços topológicos Xλ,τλ, a topologia produto é a menor topologia de λΛXλ onde as projeções em cada coordenada,

πγ : λΛXγ Xγ (xλ)λΛ xγ ,

são contínuas. O espaço (topológico) produto λΛXλ,τλ, é o conjunto λΛXλ, dotado da topologia produto.

Desta forma, a topologia produto é a topologia mais fraca tal que as projeções canônicas πλ são contínuas. Novamente, o leitor fica encarregado de enunciar e demonstrar uma proposição análoga a 7.21.

Proposição 7.27. Dada uma coleção qualquer de espaços topológicos Xλ,τλ, seja X o espaço produto munido da topologia produto. Então, f : Y X é contínua se, e somente se, πλ f é contínua para todo λ Λ.

Demonstração. Basta aplicar a Proposição 7.14. □

Exemplo 7.28. Considere o conjunto X = [0,1] e as seguintes normas

x1 = supn xn x2 = supn 1 n + 1 xn.

A topologia da norma 2 é a topologia produto. De fato, nesta norma, a bola centrada em a, de raio 𝜀 > 0 é igual a

nB(n+1)𝜀(an) = B𝜀(a0) × × B(N+1)𝜀(aN) × n[0,1],

onde N é tal que (N + 1)𝜀 > 1.

A topologia da norma 1 é mais forte que a topologia produto. Neste caso, a bola centrada em a, de raio 𝜀 > 0 é igual a

[0,1] nB𝜀(an),

que pode não é aberto quando B𝜀(an)[0,1] para uma quantidade infinita de índices n.

Proposição 7.29. Sejam Xλ,τλ espaços topológicos, e πγ as projeções canônicas

πγ : λΛXλ Xγ.

Então, cada πγ é uma aplicação aberta.

Demonstração. De fato, vamos mostrar que πγ é uma aplicação aberta quando o produto λΛXλ é dotado da topologia cuja base são os conjuntos da forma

A = λΛAλ,

onde Aλ τλ. Note que esta topologia é mais forte que a topologia produto, e portanto, se πγ for uma aplicação aberta nesta topologia, será aberta na topologia produto. A imagem por πγ de A é Aγ, que é aberto. Como a imagem de uniões é a união das imagens, e os abertos são uniões de elementos da base, segue que πγ é uma aplicação aberta. □

Proposição 7.30. Sejam Xλ,τλ espaços topológicos, X = λΛXλ o espaço produto e πγ as projeções canônicas

πγ : X Xγ.

Então, escolhendo x = (xλ) X, para cada γ Λ, o conjunto da forma

X(γ,x) = λΛ λγ πλ1(x λ)

é homeomorfo a Xγ.

Demonstração. A topologia de X(γ,x) é gerada pela família

X(γ,x) πλ1(A),

onde λ Λ, e A é um aberto de Xλ. Mas exceto quando λ = γ, esses conjuntos ou são vazios, ou iguais a X(γ,x). Assim, a topologia de X(γ,x) é gerada pela família

X(γ,x) πγ1(A),

onde A é um aberto de Xγ. Essa família é uma topologia. Portanto, esses são exatamente os abertos de X(γ,x). Isso implica que a bijeção contínua πγ|X(γ,x) é também uma aplicação aberta. De fato,

πγ(X(γ,x) πγ1(A)) = A.

Ou seja, πγ|X(γ,x) é um homeomorfismo. □

Exemplo 7.31 (Representação Decimal). Considere o conjunto D = 0,1,,9 dos dígitos de 0 a 9. O espaço X = D pode ser utilizado para representar números reais no intervalo [0,1]. Enxergamos um elemento (a0,a1,) X como sendo o número real cuja representação decimal é 0,a0a1a2. Formalmente, a representação é feita pela função

f : X [0,1] (an)n nan10n1 .

Note, no entanto, que a aplicação f não é uma bijeção. Apesar de f ser sobrejetiva, existem números que possuem duas representações distintas. Por exemplo,

0,100000 = 0,099999.

Na topologia produto, uma sequência an = (ajn)j converge para a = (aj)j, quando para todo j , ajn aj. No entanto, como D é discreto, isso significa que a partir de um certo N = Nj,

n N ajn = a j.

Em outras palavras, para todo J, existe N tal que

n N j J,ajn = a j.

Assim, na topologia produto, an converge para a quando para todo J, a partir de um certo n, os J primeiros termos de an coincidem com os J primeiros termos de a. Em particular, a aplicação f é contínua, pois se an D converge para a D, então, para todo M, existe N tal que os primeiros M termos de an coincidem com os de a, para todo n N. E isso implica que f(an) f(a).

É comum utilizarmos o espaço 0,1, ao invés de D. Neste caso, trabalhamos com a representação binária dos elementos de [0,1].

Exemplo 7.32 (Espaço de Funções: convergência pontual). Sejam X um conjunto qualquer, e Y um espaço topológico. Podemos identificar as funções f : X Y com os elementos do conjunto

Y X = xXY x,

onde Y x é uma cópia do espaço Y . Se dotarmos Y X da topologia produto, temos uma noção de convergência no espaço das funções de X em Y . Nesta topologia, uma vizinhança V de f : X Y são as funções g : X Y que para um certo número finito de pontos (coordenadas) x1,,xn X, g(xj) e f(xj) diferem “pouco”. Para que g pertença a esta vizinhança V , não faz diferença que valores g assume em pontos diferentes de x1,,xn. Para ser preciso, uma vizinhança V é um conjunto que contém πx11(U1) πxn1(Un) para determinados x1,,xn, e determinadas vizinhanças Uj 𝒱(xj).

Pela Proposição 5.17, uma sequência fn : X Y converge para f : X Y nesta topologia, exatamente quando, para todo x X, fn(x) f(x). Por isso, esta topologia no espaço das funções de X a Y é chamada de topologia da convergência pontual, ou topologia da convergência ponto a ponto.

7.3.4 Exercícios

7.3.1.

Seja f : X Y uma aplicação qualquer entre os espaços topológicos X e Y . O gráfico de f é o conjunto

Gr f = (x,f(x)) X × Y x X.

Mostre que quando f é contínua e Y é um espaço métrico, o seu gráfico é um subconjunto fechado de X × Y . (Veja também a definição de espaço de Hausdorff: 9.29)

7.3.2. Encontre uma função contínua f : X Y cujo gráfico não seja um subconjunto fechado de X × Y .

7.3.3.

Mostre que o conjunto

H = (x,y) 2 x0,y = 1 x

é fechado em 2.

7.3.4.

Mostre que, apesar de

H = (x,y) 2 x0,y = 1 x

ser um conjunto fechado pelo exercício 7.3.3, a projeção de H na primeira (e também na segunda) coordenada não é um conjunto fechado.

7.3.5. Explique o que representa o conjunto X(γ,x) na Proposição 7.30.

7.3.6. Explique porque, na demonstração da Proposição 7.30, X(γ,x) πλ1(A) ou é vazio ou é X(γ,x) quando λγ.

7.3.7. Por que no Exemplo 7.31 pudemos afirmar que f : X [0,1] é contínua baseado apenas no fato de

xn x f(xn) f(x)?

7.3.8. Seja Xλ,τλ (λ Λ) uma família de espaços topológicos e Γ Λ um subconjunto de índices. Vamos denotar por

XΛ = λΛXλ e XΓ = λΓXλ.

Mostre que a aplicação

ΠΓ : XΛ XΓ (xλ)λΛ (xλ)λΓ

é contínua e aberta.

7.3.9. No mesmo contexto do Exercício 7.3.8, suponha que Γ̃ é uma partição de Λ. Mostre que a aplicação

f :XΛ ΓΓ ̃XΓ x (ΠΓ(x))ΓΓ ̃

é um homeomorfismo.

7.4 Topologia Quociente

Quando temos um conjunto qualquer X, é comum querermos identificar uma classe de pontos de X como se fossem um só. Por exemplo, o círculo pode ser visto como o intervalo [0,1] com os pontos 0 e 1 identificados. A ideia é particionar X em classes de equivalência. O intervalo [0,1] com os pontos 0 e 1 identificados corresponde à partição

0,1 x x (0,1).

O círculo também pode ser visto como com os pontos x e y identificados sempre que x y . Neste caso, é particionado pela família

x + x ,

onde x + = x + z z .

Ou seja, tomamos uma família X̃ de subconjuntos A X disjuntos, tais que

X = AX̃A.

Existe uma projeção natural

π :X X̃ x [x] ,

onde [x] é o único elemento A X̃ tal que x A. Assim, podemos colocar em X̃ a topologia final induzida por π.

7.4.1 Relação de Equivalência

Estamos preocupados em “particionar” um conjunto X e pensar no conjunto X̃ formado pelos elementos da partição escolhida. Uma maneira muito comum de se escolher uma partição de X é através de uma relação de equivalência. Não vamos entrar em detalhes quanto às propriedades das relações de equivalência, mas de fato, definir uma relação de equivalência no conjunto X equivale a particioná-lo.

Definição 7.33. Uma relação em um conjunto X é simplesmente um subconjunto de X2. Usualmente escrevemos

a b

ao invés de dizer que (a,b) pertence à relação .

Definição 7.34. Uma relação (binária) definida em um conjunto X é uma relação de equivalência se satisfizer, para todo a,b,c X,

  1. a a.
  2. a b b a.
  3. a b e b c a c.

Definir uma relação de equivalência em X é equivalente a particioná-lo, pois dada uma relação de equivalência podemos particionar X em classes de equivalência, ou seja, nos conjuntos

[a] = x X x a.

Do mesmo modo, dada uma partição Aλ de X, podemos definir a relação de equivalência

a b Aλ tal que a,b Aλ.

Notação. Dada uma relação de equivalência em X, denotamos por X o conjunto das classes de equivalência de . A projeção natural de X em Xé a aplicação dada por

π :X X x [x] .

Ao identificarmos, por exemplo, os pontos 0 e 1 do intervalo [0,1] para formar o círculo, chamando esse ponto identificado de p, a topologia que esperamos deve ser tal que, uma sequência converge para o ponto p sempre que se aproximar do conjunto 0,1. Dessa forma, uma sequência que se aproxima de p = 0,1 é uma sequência que se aproxima de 0, ou de 1, ou que “oscila” entre esses dois pontos. O que queremos, é que cada vizinhança de p seja união de uma vizinhança de 0 e uma vizinhança de 1. Ou seja, queremos que a projeção canônica, π : [0,1] (0,1) p seja contínua. Mas também, não esperamos que uma sequência que nem mesmo se aproxima de 0 ou de 1 seja considerada uma sequência que se aproxima de p. Queremos que a topologia seja a mais forte possível com esta propriedade.

Definição 7.35 (Topologia Quociente). Quando X é um espaço topológico e uma relação de equivalência definida sobre X, a topologia quociente em X é a topologia final induzida pela projeção natural.

Seja X um conjunto e uma relação de equivalência em X. Suponha que a aplicação

f : X Y

seja tal que a b f(a) = f(b). Neste caso, podemos definir

f̃ :X Y [x] f(x) .

Note que o seguinte diagrama

 X|CC
π | CCfCC
    |    CCC!!
X∕∼ --˜--//Y
      f

é comutativo. Assim, pela Proposição 7.15, sabemos que a topologia quociente fará com que uma eventual continuidade da aplicação f seja equivalente à continuidade de f̃.

Construções com “quocientes” são muito comuns, por exemplo, em álgebra, onde quocientamos grupos por subgrupos, anéis por ideais, espaços vetoriais por subespaços vetoriais e assim por diante. Em muitos casos, essas estruturas algébricas são também dotadas de topologia. Mais a diante, no Capítulo ??, por exemplo, veremos como o estudo da topologia pode facilitar a compreensão desses espaços.

7.4.2 Exemplos

Exemplo 7.36 (O Círculo Unitário 𝕊1).

O círculo unitário 𝕊1 pode ser visto, dentre outras maneiras, como o subconjunto dos números complexos de valor absoluto 1, ou como o conjunto , onde

a b a b .

Costumamos denotar este quociente por .

Neste caso, podemos pensar, por exemplo, nas seguintes topologias em 𝕊1:

  1. A topologia induzida em 𝕊1 quando visto como um subconjunto de .
  2. A topologia final induzida pela aplicação
    f : 𝕊1 x exp(2πix) .
  3. A topologia quociente dada pela identificação usual entre 𝕊1 e .

As topologias dos itens (2) e (3) são de fato a mesma topologia. Isso porque a relação de equivalência do item (3) é dada exatamente por

a b f(a) = f(b),

fazendo com que o diagrama

 ℝ
  |HHHH f
π |   HHHHH
    | -----//$$1
ℝ∕ℤ   f˜ 𝕊  ⊂ ℂ

seja comutativo. Onde f̃ é justamente a bijeção que usualmente identifica e 𝕊1. As aplicações f e π são contínuas respectivamente na topologia final induzida por f e na topologia final (topologia quociente) induzida por π. Pela caracterização de topologia final dada pela Proposição 7.15, isso implica que tanto f̃ quanto f̃1 são contínuas. Ou seja, f̃ é um homeomorfismo.

Quanto à equivalência entre os itens (1) e (3), considere 𝕊1 com a topologia induzida. Sabemos que, como f é contínua (Exercício 7.4.1), então f̃ também é. Para concluir que todas as três topologias são iguais, precisamos mostrar que f̃1 é contínua quando 𝕊1 é dotado da topologia induzida. Isso será feito mais adiante. Será consequência direta da Proposição 9.34.

Exemplo 7.37 (O Toro 𝕋n). A forma da Figura 7.1 é o chamado toro bidimensional: 𝕋2. Uma generalização é o toro n-dimensional: 𝕋n. O círculo é o toro unidimensional.


PIC


Figura 7.1: Um toro bidimensional, além de poder ser visto como um subespaço do 3, pode também ser identificado com o produto cartesiano 𝕊12. O toro não é sólido. É apenas a “casca da figura”.

O toro n-dimensional pode ser definido como o espaço produto 𝕋n = 𝕊1 × × 𝕊1 de n cópias do círculo unitário (Figura 7.1), mas também pode ser visto como o espaço quociente n, onde a relação é dada por

a b a b n.

Costumamos denotar este quociente por nn.

Assumindo que 𝕊1 é munido da topologia do item (2) do Exemplo 7.36, podemos colocar no toro a topologia produto ou a topologia quociente. Novamente, ambas as topologias irão coincidir. Para ver isso, basta considerar o diagrama comutativo

ℝn|N
  | NNNNNf
π |     NNNNN
 ℝn∕ℤn -----//𝕊1 ×''⋅⋅⋅ × 𝕊1
        ˜f,

onde f̃ é dado por

f̃ : nn 𝕊1 × × 𝕊1 ([x1],,[xn]) (exp(2πix1),,exp(2πixn)) .

Note que f̃ é a identificação usual entre nn e 𝕋n.

7.4.3 Exercícios

7.4.1. Mostre que,

f : x exp(2πix) ,

onde exp(i𝜃) = cos(𝜃) + isin(𝜃), é contínua nas topologias usuais de e .

7.4.2. Suponha que a projeção canônica π : X X seja uma aplicação aberta e que f : X Y,τY é uma bijeção. Então,

 X| CCC
 π|  CCfCC∘π
    |     C!!C
X ∕∼ -f--// Y,

f é homeomorfismo se, e somente se, f π é aberta e fechada.

7.4.3. Dê um exemplo de uma relação de equivalência em X tal que a projeção canônica π : X X não é aberta.

7.5 Topologias das Sequências Convergentes

Esta seção pode (e deve!) ser omitida. É apenas uma divagação sobre convergência de sequências. Ao fazer analogia com os espaços métricos, o estudante frequentemente se pergunta porque é que nem sempre se pode usar sequências para determinar as propriedades topológicas de um espaço.

Se temos um conjunto X e uma topologia τX sobre X, sabemos exatamente quais são e quais não são as sequências convergentes. No entanto, conhecer as sequências convergentes não garante que conheçamos a topologia. De fato, duas topologias distintas podem ter exatamente as mesmas sequências convergentes, convergindo para os mesmos limites.

Exemplo 7.38 (Topologia Coenumerável). Seja X um conjunto não enumerável, e

τ1 = 𝒫(X).

As sequências convergentes em τ1 são aquelas que a partir de um certo índice se tornam constantes. Ou seja, as sequências constantes a menos de um número finito de termos.

Considere agora τ2 dada por

τ2 = A X Ac é enumerável.

Fica como exercício mostrar que τ2 é de fato uma topologia. Evidentemente que as sequências constantes a menos de um número finito de termos convergem nesta e em qualquer outra topologia. Considere então a sequência x1,x2,. Suponha que

xn τ2x.

O conjunto

V = xn xnxc

é vizinhança aberta de x em τ2. A convergência de xn implica que para um certo N,

n > N xn V.

Mas xn só está em V se xn = x. Ou seja, xn é constante a menos, possivelmente, de x1,,xN.

Pergunta: porque sabemos que τ1τ2?

Dado um espaço topológico X,τX, podemos indagar se existe uma topologia τm que é a menor onde as sequências convergentes são as mesmas que de τX. Também podemos nos perguntar se não existe a maior topologia τM com esta mesma propriedade. Se existir, τm será a interseção da família de todas as topologias τλ (λ Λ) tais que para todo x X,

xn τλx xn τXx.

Vamos definir τm como sendo

τm = λΛτλ.

Evidentemente que como τm τX, então toda vizinhança de x em τm também é uma vizinhança em τX. Portanto,

xn τXx xn τmx.

No entanto, a implicação contrária pode não ser verdadeira. Ou seja, é possível que, para a topologia τm, não tenhamos

xn τmx xn τXx.

Para um exemplo, veja:
http://math.stackexchange.com/questions/395980/topology-_for-_convergent-_sequences Para compreender o exemplo é necessário conhecer um conceito mais avançado chamado “ultrafiltro”. Para nossos propósitos, basta dizer que o exemplo se trata de uma família de topologias τβ no conjunto tais que xn τβ equivale à existência de N tal que

n N xn = .

No entanto, em τ = τβ, xn τ equivale à existência de N tal que

m > n N xmxn ou xm = xn = .

Ou seja, xn τ sempre que xn “sai” de qualquer subconjunto finito de .

Por outro lado, vamos definir a topologia

τM = V X xn τXx V N,n N,xn V .

É evidente que τM é uma topologia e é mais forte que τX. O leitor é convidado a demonstrar essa afirmação.

Como τX τM, sabemos que

xn τMx xn τXx.

Por outro lado, pela definição de τM, sabemos que

xn τXx xn τMx. (7.2)

Ou seja, sempre existe a topologia mais forte determinada pela família de sequências convergentes de uma toplogia τX dada. Em outras palavras, denotando por a família de topologias

= τλ λ Λ,

temos que τM = é tal que τM , mas pode ocorrer que τm = não pertença a .

7.5.1 Exercícios

7.5.1. Mostre que a topologia coenumerável (τ2 no Exemplo 7.38) é de fato uma topologia.

7.5.2. Por que sabemos que τ1τ2 no Exemplo 7.38?

7.5.3. Demonstre a implicação da Equação 7.2 na página 315.